CASA BARÃO DE MELGAÇO
CENTENÁRIO: RUBENS DE MENDONÇA
25 de fevereiro de 2015
Face satírica
Entre brincar e educar: Rubens de Mendonça
Marília Beatriz , Cadeira N° 2 da AML
A MODO DE INTRODUÇÃO
Creio que Rubinho amaria que daqui deste lugar que foi dele e que é dele até hoje não apresente limites e trancas tanto para sua verticalidade expressiva quanto para sua horizontalidade pensamental.
O que vou falar neste espaço não é só do mundo das letras. Intento mostrar a rebeldia sígnica do filho de Estevão de Mendonça. Momentos para fazer todos que aqui estão esquecer um pouco das coisas duras como falta de água, energia cara a propósito: SE A ENERGIA É BARATA/É BOM ASSIM CONSERVAR/ SE A CEMAT NÃO DÁ LUZ/ PRÁ QUE O PREÇO AUMENTAR?
A poligrafia de Rubens de Mendonça dá a nota, os acordes e a harmonia de verdadeiras partituras na escrita que transita por todos os gêneros e alça voos os mais inusitados. De um historiador que vai buscar na memória a gênese de muitos fatos como herdeiro ilustre de Estevão de Mendonça, de articulista esmerado, poeta com nova construção: o
moderno vivificando as pegadas cuiabanas, prosador cujo resultado é a efervescência na arquitetura do texto, Rubens deixa entrever porque é ponta de lança nas letras de nossa terra.
A semiótica de Rubens é domada por sua maneira de esculpir a escrita, ao trabalhar o cinzel trata de esboçar, formular e apresentar as cenas de seu tempo, em seu tempo e para lá de qualquer tempo com vívidas traduções.
Constituem temas de seu interesse fragmentos jocosos que na abordagem dele configuram e conformam signos do cotidiano, da res publica vidas novas e presenças antigas. O fascínio que exerce sobre a imaginação de seus apreciadores é único. Na fatura satírica de Rubens de Mendonça o que aparece é o privilégio da ressignificação das coisas, a pessoalidade do
escritor eclode. Tudo é motivo da avaliação festiva, do bom humor. A graça na praça, a comicidade na cidade, o humor em família e o riso polido na cara do político fazem a moldura dos efeitos que o gozador precisa para construir suas imagens.
LIBERDADE, LIBERDADE ABRE AS SOBRE NÓS.
O artista mostra os moldes da liberdade que brotam no formato cultural e na competência inserta nas cenas, nos artigos e nas graças que deixou em nossas letras. Pensar que a literatura ou a arte deve ser sempre útil é cair em doutrina ultrapassada. Há uma questão que importa em todos os segmentos artísticos: Para que ou para quais pessoas algo pode ser útil ou danoso? Existe uma via de pensamento que é profundamente inovadora, revolucionária suficiente para apontar outras rotas. É aqui que encontro um Rubens de Mendonça ocupando o espaço lúdico e ao mesmo tempo didático com o riso escancarado ou mascarado. Um ser que descobre e cria, perfaz e produz de acordo com suas ânsias e paixões por conta de suas necessidades vitais.
O autor que residia ao lado do Clube Feminino, o poeta que encantava seus leitores com o DOM POR DO SOL o educador que buscava a UFMT são pontos que surgem como cenário da vívida fortuna que foi sua estrada. O texto na trama do riso é ao mesmo tempo terreno por onde repousa o ensinar. O didático vai de mãos dadas com a brincadeira, aqui reside a precisão de unir as duas faces: o jogo e o ensinamento, em nenhum momento o autor pensou em DAR RESPOSTAS DEFINITIVAS, CONCRETAS. Indica algo e não pretende resolver.
Eis aqui em Ruas de Cuiabá: “Esse erro judiciário me faz lembrar a sugestão de Pitigrilli que achava que a cadeira de um juiz deveria ser forrada com a pele do juiz antecessor que tivesse sido injusto. (La Meravigliosa Avventura), citando Pitigrilli chama atenção para a leitura de Autor permanentemente sarcástico e lido por muitos brasileiros e alguns latino americanos como Julio Cortázar. Eis um jeito de ensinar citando referências. Aliás, educar não é garantia de que as coisas são locais e imutáveis, intangíveis e de que não podem ser transformadas isso é algo que não condiz com o verdadeiro modo de querer melhorar a pessoa. O fato do ser humano percorrer as vias da dúvida mostra que para desenvolver é preciso experienciar, buscar e não viver picotando falsas verdades.
O LÚDICO QUE IRROMPE EM RUBENS TEM QUE MENSURAR A QUANTIDADE DE LIBERDADE QUE EXISTE NA POÉTICA DO INCONSCIENTE.
O QUE APARECE É POÉTICO E NÃO TEM COMO NÃO SER PORQUE OS SIGNOS DO PRAZER, DO GOZO E DO BRINCO SÁO TEMAS CONSTANTES NO ROSTO DO ESCRITOR.
Adivinhações
Eis a estrada de uma questão:
Como falar de algo que sempre me pegou? Adélia está aqui para testemunhar que sempre fui amante do SERMÃO AOS PEIXES. Estive envolvida e enredada pela coisas do humor de Rubens de Mendonça desde sempre. Não consegui me desligar do encanto que sentia por
aqueles escritos. Meu pai me conduzia a passeios, em conversas com amigos ou simplesmente olhando o céu azulado sempre pensava Em Rubens e retornava a magia das trovinhas e ao “RIDENDO CASTIGAT MORES”. E ele com sua doçura sabia bem disso porque teve um momento em que ele desafiou:” faça vc uma trovinha “ E quedei espantada. O que fazer? E se mesmo obcecada, metida em vários novelos não fui capaz de transformar os bichos internos em gatinhos macios e a ideia em coisa com lucro? Resolvi conviver e esperar o dia para desmarcar a minha mania de querer jogar e também respeitar o brinquedo do autor.
Outra questão me incomodava: como era possível a estatura extensa de alguém que sabia edificar a sátira na Cuiabá de antanho com tal primor e destemor?
Há naqueles discursos lúdicos tanto sob o pto. de visto estético quanto no ideológico um avanço que sem dúvida é uma das + importantes aquisições das letras mato-grossenses. Tal avanço é visível em SÁTIRA NA POLÍTICA DE MATO GROSSO. Lá está à estrutura imagética dos fatos e a referencialização tópica da poesia satírica.
Diálogo crítico/criativo = Sátira na Política de Mato Grosso
A linguagem desenvolvida neste livro cria a ambiência perfeita do modo como é concebido o desenho satírico. Aqui ele vai desencavar os defeitos e vícios e colocar na cara, bem a mostra o quilate de alguns dos políticos de Mato Grosso.
Com efeito, ele responde aos desejos de conhecimento da “essência de certos homens políticos mato – grossenses” via uma letra satírica que busca o signo mais importante para se constituir nas estruturas emblemáticas do ser, do sabor e do narrar.
Nosso Rubinho é particularmente produtivo nesta mirada, uma vez que enfoca as relações da política com o ridículo, do poder com a ignorância e dos próximos (amigos ou não) com suas irreverências.
Ele mesmo afirma: “Nosso objetivo é de registrarmos os fatos que ocorreram numa época de prosperidade (política) em nosso Estado, cujos dados vão desaparecer se o Arquivo Público continuar abandonado como está” Eis o modo do escritor chamar a atenção para fatos que desabonam o acervo memorialístico de nossa terra. Os brados dos Mendonças e de tantos outros são relevantes para os cuidados com a Cultura exigidos até hoje. Presente então um recorte da pedagogia do intelectual cuiabano que é um perfeito contador de histórias, narrador seguro e desafiador junto com Gervásio Leite da impostação elitista que não se prende às gavetas, aos empolados textos e outros trejeitos. Com tais falas ergue o
arcabouço crítico e de denúncia. Para em seguida alertar:
TROVA DO POVO! POESIA
DE SIMPLES INSPIRAÇÃO!...
MAS CONTÉM QUANTA IRONIA
SE CASTIGA UM MEDALHÃO!... A trova que se dobra sobre ela mesma como num jogo de reflexos. O lado criativo de mãos dadas com a chibatada.
As entranhas estranhas do texto satírico
É como certa a possibilidade da sedução que o autor cria no leitor/apreciador São variadas formas de convite que ele lança para capturar a leitura admirável. Cria um admirador/espectador que por estranhas interpretações possui o entranhado tecido satírico e diz:
O HOMEM È COMO FORMIGA/ SE QUISER MORRER CRIA ASA... FAZ
O QUE NINGUÈM O OBRIGA/ FICA BOBO, CRESCE E CASA!
A sátira como diz o próprio Rubens é o “ter ao menos alguma semelhança com a verdade” O problema é saber de que verdade ele trata. Assoma que a elaboração na qual ele perpetra seus versos satíricos é a expressão dos mais diversos recursos de apresentação. A verdade pode ser retrato, denúncia, travessura ou simples gozação. De todo modo são os diversos pontos de vista sobre o qual ele vê o universo. Verdade não é coisa estagnada, é múltipla. A verdade em Rubens é plural: relação pessoa/comportamento, moral/ação, direito / avesso.
Signo exemplar: NO CHURRASCO DO ARQUIMEDES/VI GERVÁSIO PERGUNTAR AFINAL AUGUSTO MÁRIO ONDE VAMOS ALMOÇAR?
Eis a maneira de jogar o comportamento na cara do sujeito. Signos que desenrolam ações para brincar: A PALAVRA FANTASIA/ NÃO SE MEDE POR TAMANHO/ MAS É MUITA PORCARIA /POETA NÃO TOMAR BANHO.
E para significar a dualidade moral/ação venha Rubens: SE NÃO HOUVESSE IDIOTAS/ QUE SERIA DOS LADINOS? NÃO HAVERIA TROFÉU BORÔRO/ SE NÃO HOVESSE CRETINOS
As funções da linguagem em Rubens de Mendonça carregam toda possibilidade da arte fascinante que a Cidade cuiabana, que a gente de parcimônia, que o tesouro encravado nesta terra desperta cotidianamente.
O CUIABONOSSENSE que está em Rubens, fez de Cuiabá o Mato Grosso INTEIRO de sua janela da Rua do Campo visualizou os ricos traços das letras, pedras preciosas que se transfiguraram na obra INCANDESCENTE. Forma moderna de dar sentido para a dialogia satírica. Estou aqui pela luz generosa de Adélia (filha de Rubens de Mendonça) com aval da Casa Barão de Melgaço e devo dizer que como ando querendo descobrir qual é o Lugar
do desejo sem lugar, penso que para que o desejo se lance em ato para que a força das letras satíricas, árvores que são da literatura de Rubens, se edifique em ramos, para que tudo se torne signo é necessária uma escolha.
E é da injustiça da escolha que a vida nasce. E para ser o que é agora aqui tive que reduzir Rubens nesta tentativa. Estou em desespero, pois não sei se alcancei o intento de dar asas porque tive a exata medida de que aquilo que é, é INJUSTO. INJUSTO? RUBENS NÂO ESTA + AQUI embora todas as suas palavras, toda sua criação doce/ cruel, a sua família encantadora...
Não devo recusar as contradições devo recebê-las, pois elas são força: O MENU QUE FEZ GERVÁSIO/IA SE TORNANDO FATAL...POIS FILÉ DE PESCOÇO QUASE MATA O GENERAL!
Todos os dias a ludicidade rondava a porta do crítico-satírico para dar forma a novas trovas. Meditava nas canções, rimas, boatos e preocupações do povo e ia criando o mosaico imagético do documentário desta gente.
Qual mestre diretor, qual fabricante de nosso mosaico desenhava e montava o solo pelo qual passamos todos os dias, traduziu a personalidade no espaço intervalar e ainda entra em nossas vidas a todo e qualquer momento.
Veja só o que preparou o Autor: DINHEIRO PÚBLICO E CRIANÇA/ SÃO DIFÍCEIS DE PEGAR!/ SE A GENTE PEGA SEM JEITO/ ELES COMEÇAM A GRITAR/ E NASCE DESCONFIANÇA/ E FAZEM TAL CONFUSÃO/ QUE COMPROMETE O SUJEITO/ IDENTIFICA O LADRÃO.
É preciso dar termo ao meu falar e para tanto apresento:
Vitrine de trovinhas
VER TANTOS BURROS MANDANDO / EM HOMENS DE INTELIGÊNCIA/ QUE ÀS VEZES FICO PENSANDO / QUE A BURRICE É UMA CIÊNCIA
ESSE RELÓGIO PARADO/ LIBANESES QUEM NOS DEU/ PARA ELE ANDAR CORRENDO BASTA CHAMAR UM JUDEU!
LIVRO E MULHER NÃO SE EMPRESTAM/ LIVRO NÃO SE RESTITUI.../ MULHER A RAZÃO CONCLUI/ RESTITUIR-SE NÃO PRESTA.
NECESSÁRIO EXPLICAR QUE ESSE GOZO satírico VEM DE GAUDIUM, A ALEGRIA DE GANHAR, DE LOGRAR, O LUCRAR COM ASTÚCIA. COISA DE CUIABANO, QUE ENGANA A PALAVRA POÉTICA E BURLA ARDILOSAMENTE.
Venha mais uma vez Rubens para matar as saudades e traga suas trovas para alegria nossa de cada dia e PARA RESPONDER AO DESAFIO DO MEU QUERIDO AMIGO Rubens de Mendonça eis a trova que hoje trago a público e que espero vá fisgar o sorriso dele :
Tenho certeza que este Mendonça/É o Rubens/Que sem medo de D. Onça/Sempre anda nas nuvens
E viva a Festa dos 100!